No ano 2007 um grupo de professoras de uma escola pública de Natal me pediu para pesquisar e escrever sobre provérbios populares. Saí a cata de ditados, lembrei das expressões que mamãe gostava de dizer e, perguntando a um e a outro, nasceu Coisas Que Vovó Dizia.
Veja algumas estrofes:
Sempre
prestei atenção
ao que minha
vó dizia:
“Na casa
do homem honesto,
Deus é
sempre o bom vigia.”
“Quem fica
em paz em sua casa,
faz a
melhor romaria.”
A frase que
lhe apresento
tem uma
beleza rara:
“-Não há
quem cuspa pra cima
que não
lhe caia na cara.”
doze palavras
que mandam
uma mensagem
tão clara.
Para dizer
pro seu filho
pra ele ter
mais cuidado
pra não se
doar demais
e depois ser
enganado:
“Quem se
mete a redentor,
termina crucificado.”
O folheto Conselhos Pra Juventude nasceu da observação de que meus alunos do projeto O Uso do Cordel na Sala de Aula estavam precisando de conselhos a respeito das boas relações pessoais, da conscientização em relação ao não uso de drogas, a valorização da vida e outros temas.
Três estrofes pra você ver:
Os jovens
querem viver
em alta
velocidade.
Não colocam
nos seus planos
estudar na
faculdade,
e querem ter mais dinheiro
do que têm capacidade.
É por isso
que se vê
tanto rapaz
se matando,
meninos
vendendo drogas,
consumindo e
traficando,
como se a
vida deles
já estivesse
acabando.
3
Tenha calma
meu amigo,
que se você
se cuidar,
dá para se
divertir,
dá pra você
estudar,
pra namorar,
pra ter filhos,
viver a vida
e gozar.
Tudo que se
faz agora
sempre
reflete depois.
Pra se chegar
no milhão
sempre tem o
“dois mais dois.”
“No rumo do Caviar,
tem muito Feijão com Arroz!”
Se lembre que
você pode
viver mais de
oitenta anos,
que você tem
muito tempo
pra
concretizar seus planos,
e sempre escute os mais velhos
pra não cometer enganos.
Se
você ama sua vida
E
pede a Deus pra que ela
Seja
comprida e feliz
Rica,
prazerosa e bela
Siga
esse ponto de vista
Ao
atravessar a pista
Use
sempre a passarela
Não
jogue o lixo nas ruas
Mantenha
o lixo ensacado
Coloque
no lugar certo
Pra
ele ser resgatado
Pelo
carro da coleta
Que
o processo se completa
Quando
ele for reciclado
Se
acaso estiver num carro
Que
esteja em movimento
Não
jogue pela janela
Espere
o certo momento
Depois
que o carro parar
Você
pode se livrar
Do
lixo que está lá dentro
Mesmo
com o carro parado
Não
jogue o lixo no chão
Retire
o lixo do carro
Pra
colocar num latão
E
assim vai mostrar ao mundo
Que
você não é imundo
E
que tem educação
No ano dois mil e cinco o Brasil ficou estarrecido com a notícia do maior escândalo de corrupção da sua história: o escândalo do mensalão. Foi no auge do escândalo que escrevi o Cordel do Mensalão, que foi reproduzido aos milhares e levado para Brasília para ser utilizado em campanhas de protesto.
Curta algumas estrofes
(...)
Dia catorze
de maio
começou o
burburinho,
um dos
chefes dos correios
senhor
Maurício Marinho
foi
flagrado recebendo
três mil
reais e metendo
no bolso do
colarinho.
Mas Marinho
não sabia
que estava
sendo filmado,
falou que Roberto
Jéferson,
conhecido
deputado,
era quem
roubava mais,
quatrocentos
mil reais
todo mês era
embolsado.
Roberto
Jéferson, flagrado
no
escândalo do correio,
imaginou:-“
Tô lascado!
o tirinete
ta feio,
mas nessa
eu não vou sozinho”
-saiu
abrindo caminho
e puxando
gente pro meio.
Disse que
Marcos Valério,
um
conhecido empresário,
dono de
várias empresas
do ramo
publicitário,
fazia a
distribuição
das cotas
do mensalão
pra
político salafrário.
(...)
Dois Matutos no Hospital é um cordel muito engraçado que conta a história da visita de dois matutos ao médico urologista. O folheto traz também o causo Uma Bichinha no Céu. Este é o meu único cordel que tem um palavrão, na verdade uma palavrinha com apenas duas letras, mas deixo aqui o alerta aos pudicos.
(...)
Chegaram lá
no salão,
tinha gente
pra danado
na porta do
consultório,
tudo pra ser
consultado.
Zé sentou
numa cadeira
procurando
uma maneira
de ficar
acomodado.
Um
homem deu um sorriso
e
perguntou com humor,
se
ele sabia o tamanho
do
dedinho do doutor,
ele
lhe respondeu: “- Não,
mas
sei o tamanho da mão
que
eu vou meter no senhor.”
Um gaiato lá
do canto
gritou: “-Eita
véio macho,
quero ver
quando o doutor,
tiver com os
dedos no cacho,
e o grandão
catucando
fazendo volta
e voltando,
botando fogo
no facho.”
(...)
Essa é uma história verdadeira que aconteceu em Florânia no Rio Grande do Norte, em meados de 1877. Uma briga de famílias de coronéis por posse de terras determinou morte de José Leão. A morte do rapaz causou indignação no povo da cidade pelo fato do corpo do rapaz ter sido queimado numa fogueira no dia do padroeiro de Floânia.
(...)
Com
o aval de João Toscano
João
Porfírio chegou
e
invadiu aquela terra
que
José Leão herdou.
Agiu
como cangaceiro,
foi
chegando sorrateiro,
e
dela se apossou.
Zé
Leão ficou sabendo
e
então mandou um recado
pedindo
que João Porfírio
deixasse
aquilo de lado,
mas
ele não disse nada,
e
em cada estaca fincada
botou
um jagunço armado.
O
povo da região
sentiu
a coisa esquentando,
e
só se via as pessoas
pelos
cantos cochichando,
reclamando
da cobiça
e
da tamanha injustiça
que
estava se passando.
Zé
Leão ficou sabendo
como
é que estava o cenário,
soube
que João Toscano
era
um latifundiário,
e
coronel de patente,
que
o próprio presidente
fez
dele seu emissário.
O
coronel João Porfírio
chamou
um capanga seu
e
lhe falando baixinho
esse
recado lhe deu:
“_Prepare
uma emboscada
e
mate esse camarada,
resolva
o problema meu.”
Esse folheto traz duas histórias engraçadas: O Advogado e O Guarda e O Advogado e o açougueiro. As duas histórias tratam da sutileza e das artimanhas que os advogados utilizam para ganhar suas questões.
Veja duas estrofes de O Advogado e o Guarda.
Tem um
ditado que ouvi
Lá pras
bandas do sertão
Que diz que
advogado
Deve ter
parte com o cão
Quando o
bicho se inspira,
Verdade
vira mentira,
E qualquer
sim vira não.
(...)
O capitão
se virou
E disse ao
advogado:
_Esse
guarda nos chamou
E o senhor
foi acusado
De roubo, de
assalto, morte,
Porte de
droga e por sorte
Nada disso
foi achado.
E duas de O Advogado e o Açougueiro
Quando eu
vi o rapazinho
Já fiquei
todo orgulhoso,
Pensei:
_Ele é muito esperto,
Porém eu
sou mais tinhoso.
Pois eu
cobrei muito mais
Ganhei quarenta
reais.
Eita negócio
rendoso.
Meter-se
com advogado
Veja lá no
que resulta:
Ao receber
os cem contos
Eu vi que
perdi a luta.
Grampeado
numa fiança
Vi mil
reais de cobrança
Pelo valor
da consulta.
No dia três de março de 2008 o Governo Federal
promulgou a lei 11.465 que determina que os temas afro-brasileiros e indígenas sejam conteúdos transversais obrigatórios no currículo escolar. Fui convidado pela secretaria de Educação de Parnamirim /RN para participar de um grupo de estudo sobre o tema e, ao final escrevi este folheto que foi reproduzido e entregue em todas as escolas do município para servir de material pedagógico.
Este
ano, uma lei foi decretada.
Dia
oito de março, com afinco,
nossa
lei “onze – quatro - meia – cinco” *
foi
bem lida, relida e aprovada.
E
depois que ela foi sancionada,
no
instante passou a vigorar.
Determina
que se deva implantar
nos
currículos da nossa educação,
elementos
da miscigenação,
pra
nova consciência despertar.
Essa
lei no seu âmbito nos diz
que
a ação deve ser obrigatória
dentro
do conteúdo de história
e
da literatura do país.
Nas
artes deve ter sua raiz,
mas
também se deve mencionar
em
todo o currículo escolar,
entre
seus conteúdos ministrados,
seus
aspectos, seus rumos, seus legados,
sua
cultura, seu mundo e seu lugar.
A
História Dos Povos Africanos,
Os
Aspectos Afro-Brasileiros,
Nossos
Povos Indígenas Pioneiros,
suas
lutas por anos e mais anos.
Devem
ser colocados em seus planos
para
ser estudados com afinco,
como
o pano dobrado cria vinco,
nós
vamos aprender essa lição
e
aplicar na nossa educação,
essa
lei “onze – quatro - meia – cinco”.
No
final do cordel quero lembrar,
que
depois que essa lei foi criada
a
matéria passou a ser cobrada
nos
concursos e no vestibular.
Se
você quer se atualizar
como
bom estudante ou professor,
passe
agora a dar mais valor,
aprendendo
e ensinando essa lição,
que
estará dando pra nossa nação
uma
aula de paz e de amor.
FIM*(lei 11.465 de 03.03.2008)
Quando eu era criança, muitas vezes fui à Lagoa das Pedras para jogar bola no campinho, tomar banho ou pescar piabas. No ano dois mil e nove fui a Igreja Nova, um lugarejo próximo a Macaíba/RN e, ao passar próximo à lagoa resolvi visitá-la. O cordel Lagoa da Minha Infância retrata o que vi e a minha indignação ao observar as mudanças que ocorreram no ambiente.
Sem
crer naquilo que vi,
andei
sem olhar pro chão,
e,
sem querer, tropecei
num
pneu de caminhão,
mas
veja só como é,
o
machucão, foi no pé,
mas,
a dor, no coração.
O
pneu fazia parte
da
mudança na estrutura.
A
margem verde e macia
tava
seca, suja e dura.
Eu
tinha na minha mente
água
limpa e transparente,
tava
barrenta e escura.
Vi
que ao redor da lagoa
a
mata foi derrubada,
cortaram
os pés de mangaba
onde
eu via a revoada
de
rolinha e juriti.
E
o galho onde o bem-te-vi
fazia
sua morada.
Lá
do lado da praínha,
vi
o mais triste cenário.
Cortaram
a velha umburana,
que
era sombra do estuário.
Achando
ser esperteza,
destruíram
a natureza
pra
fazer um balneário.
Resolvi
ver mais de perto.
Encostei-me
ao ambiente,
e
vi foi saco de plástico,
camisinha,
absorvente,
matérias
não degradáveis,
copos
brancos descartáveis,
e
até cocô de gente.
O Caga Sebite, conhecido também por
Sebite, é um pássaro pequeno que tem as mesmas cores do Bem-te-vi. Papo
amarelo, asas pretas e riscos brancos na cabeça. A diferença está no tamanho do
corpo e no canto. O canto do Sebite é bonito e longo. Até pouco mais de dez
anos essa ave era comum no litoral e nos seus arredores, porém nos últimos anos
tornou-se raro vê-lo pelos pomares e coqueirais de fundos de quintal dos
arredores das cidades, reflexo da poluição sonora, da poluição do ar, da
diminuição da quantidade de alimentação e da ganância do homem que, ao notar
que ele tornou-se animal raro, passou a capturá-lo para vendê-lo em feiras. Este cordel é
minha homenagem a esse pequeno pássaro.
Algumas estrofes:
(...)
Pássaro
pequeno e amarelo...
Tinha muitos
por aqui.
Nos pés de
seri-güela,
nos galhos
de sapoti.
Cantava sem
paralelo,
com seu
papinho amarelo,
parecendo um
bem-te-vi.
Ele alegrava
as manhãs.
E animava
corações.
Solfejando
as belas notas
das mais
bonitas canções,
e vinha
fazer poleiros
nos galhos
dos cajueiros,
que nasciam
nos oitões.
O homem foi
construindo...
Um
loteamento, um acesso,
um
condomínio, uma casa;
e durante
esse processo,
cortaram a
velha mangueira,
um coqueiro,
uma jaqueira,
tudo em nome
do progresso.
Nos pés das
cercas de vara,
nasciam pés
de melão,
e, ali, eles
achavam
sua
alimentação,
mas o
progresso tirano,
levou o
melão caetano,
e o sebite à
extinção.
(...)
José Acaci
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